Acompanhei nesta manhã a homologação do acordo de reparação pelos danos causados pelo crime socioambiental da Vale em Brumadinho. É no mínimo irônico que a cerimônia de assinatura de um acordo construído a portas fechadas, sob confidencialidade e sem participação popular, tenha sido transmitida ao vivo. Assim como as famílias atingidas e as entidades que as apoiam, eu e os outros parlamentares da Comissão Externa só tomamos conhecimento dos termos do acordo após a assinatura.
É nítido o interesse do governo de Minas em inflar o resultado das negociações como “o maior conjunto de medidas de reparação da América Latina”. Como poderia ser diferente? A tragédia criminosa em Brumadinho teve um impacto socioambiental sem precedentes: foram 272 pessoas mortas, 11 desaparecidas, dezenas de comunidades e ecossistemas em risco e um rio arrasado pela lama. Estive em diversas audiências com as comunidades atingidas e posso dizer que esse valor é inestimável.
Na ponta do lápis, dá pra ver que o estrondo anunciado pelo governo não é bem isso tudo. Os 37 bilhões de reais acordados representam 31% a menos que os cerca de 55 bilhões estimados em estudos técnicos produzidos pela Fundação João Pinheiro e pelo MPMG para a reparação dos danos. Como não houve transparência nas negociações, não sabemos as razões pelas quais o estado aceitou abaixar tanto.
Não é que a Vale não tenha como pagar, né, gente. No fim de 2020, ela se tornou a empresa mais valiosa da América Latina. O valor de suas ações dobrou, atingiu a máxima histórica e segue animando analistas e investidores no mercado financeiro. Só no terceiro trimestre do ano passado, acionistas receberam um total de 12,4 bilhões de reais em dividendos e juros sobre capital próprio. Não faltam recomendações de investimento na empresa, nem menções aos seus esforços para reparar os danos causados.
Se a empresa criminosa sai ganhando de um desastre como esse, também o governo Zema sairá vitorioso, já que o acordo bilionário vai bancar até mesmo ações de infraestrutura viária, como o rodoanel em Belo Horizonte. Orgulhoso, o governador anuncia que “a perda dessas vidas não foram em vão” [sic]. A política da morte, mais uma vez.
Enquanto isso, assistimos ao lobby das empresas no Congresso, para impedir a aprovação do novo marco regulatório da mineração, que construímos com muito esforço na Comissão Externa. Os poderosos trabalharão para que o assunto desapareça em breve dos holofotes e preocupações da população.
Como deputada federal, afirmo que nosso mandato não medirá esforços em defesa das famílias atingidas. Seguimos acompanhando, integralmente comprometidas com a reparação dessa tragédia criminosa.
Imagem em destaque: MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens